Rodrigo Bernardinelli: “Inovar tornou mais fácil admitir que preciso de ajuda”  

Publicado em: 01/06/2021

Rodrigo Bernardinelli: “Inovar tornou mais fácil admitir que preciso de ajuda”  

Se no mundo corporativo muitas vezes os tropeços permanecem escondidos, ao partir para o empreendedorismo os erros começam a ser aceitos como parte necessária do crescimento

Por Rodrigo Guerra* 

Rodrigo Bernardinelli já atuava há anos como executivo de empresas multinacionais de tecnologia quando decidiu empreender em um projeto de e-commerce. E, claro, foi preciso se adaptar: “Eu tive que mudar muito a minha forma de pensar, porque eu estava acostumado a ter tudo: uma área jurídica, um RH, a operação funcionando, um carro na garagem… absolutamente tudo. Mas quando eu resolvi sair, isso mudou. Eu digo que deixei a business class para ter que pegar o ônibus Terminal Taboão para voltar para casa.”

Ao lado de outros dois sócios-fundadores, montou a startup Digibee em 2018 com a proposta de resolver o problema da integração de sistemas nas empresas. Em apenas três anos já são 138 clientes no Brasil e dez nos Estados Unidos, para onde Bernardinelli se mudou com a família em meio a pandemia. “O Brasil representa 3% do mercado global de software e os Estados Unidos respondem por 55%. Resolvemos vir logo para cá lidar com os grandes”. 

Acompanhe os melhores momentos desse bate-papo em que falamos sobre inovação e empreendedorismo dentro e fora do País. 

Rodrigo Guerra: Rodrigo, quero começar nosso papo pedindo para você apresentar a Digibee e contar de onde surgiu a ideia de criar uma empresa para solucionar a integração de sistemas de outras empresas. 

Rodrigo Bernardinelli: Eu sempre digo que o desafio da integração existe desde que a empresa ligou o segundo computador e ele precisava conversar com o primeiro. A verdade é que a integração de sistemas sempre foi feita de modo muito artesanal. Novas tecnologias foram surgindo, como cloud, APIs, plataformas IPaaS e uma série de outras soluções, e conectá-las foi ficando cada vez mais complexo. Se antes essa conexão remetia a algumas dezenas de sistemas – ou, no máximo, a algumas centenas deles em segmentos mais digitalizados, como os bancos -, hoje o processo de digitalização fez com que milhares de serviços precisem estar conectados, o que piorou o desafio da integração de forma exponencial.

Outra questão é que, mesmo com todas as tecnologias disponíveis, sempre era preciso contratar uma pessoa técnica, o desenvolvedor, para fazer tudo funcionar. E muitas vezes era nessa hora que os problemas apareciam e custavam muito para serem resolvidos. O que a Digibee fez foi isolar o problema e começar a tratar a integração de sistemas de maneira científica e, ainda mais importante, viável. Nós isolamos as pontas dos sistemas que precisam ser integrados e fazemos as adaptações necessárias para que sejam conectados na nossa plataforma. Depois, na outra ponta, o mesmo acontece e o local de destino também se conecta. Isso deixa o fluxo muito simples, orquestrando diversos sistemas ao mesmo tempo e garantindo performance, segurança, escalabilidade e resiliência. Em resumo, nós remodelamos todo o emaranhado complexo de tecnologia e o reduzimos a uma única plataforma cloud native, com uma arquitetura moderna e com workflow reduzido a três telas para movimentar os dados.

Guerra: Pelo que eu entendi, Rodrigo, diferentemente de um barramento convencional, onde a transformação e adequação dos protocolos dos dados tem que ser feita nos sistemas que serão conectados, a solução da Digibee faz essa inteligência encurtando o caminho.

Bernardinelli: E a partir disso, o cliente precisa saber apenas onde está o dado que ele precisa usar e para onde ele quer mandar. Assim, ele para de se preocupar com o tecniquês e vai pensar apenas em remetente e destinatário, tudo fica mais fácil quando visto assim. E, usando recursos de low code, criamos um fluxo de dados de informação com muita performance. 

Guerra: Você pode explicar, então, esse conceito de low code?

Bernardinelli: Low code é uma tentativa que a indústria fez para resolver o problemaço que existe de falta de mão de obra em tecnologia da informação. E o conceito não é novo, eu mesmo já vivi o tempo das ferramentas case, na qual construía-se modelos para poder gerar códigos por trás. Hoje, há diversas plataformas que permitem criar aplicações com recursos menos especializados. Mas eu não acho que o low code deva ser usado para trabalhar as principais experiências que serão entregues ao cliente, que são projetos mais nobres. Ele serve para dar produtividade e vazão a muita coisa na TI, e a integração está inclusa nisso. Nós aplicamos bastante o low code – ou no code – na nossa plataforma.

Guerra: E sobre empreendedorismo, Rodrigo, me conta como foi a história da Digibee.

Bernardinelli: Eu sou um dos sócios-fundadores e nós éramos três ex-executivos que sempre trabalharam na indústria, em empresas como a CA, HP, IBM… Até que um dia eu, o Peter [Kreslins] e o Vitor [Sousa]  resolvemos deixar os nossos empregos em uma multinacional para seguir um projeto de um conhecido nosso que queria montar um marketplace de produtos orgânicos. Eu me lembro de estar em uma fase da vida na qual queria fazer algo diferente, pois tinha muito a oferecer, e acho que foi isso que me fez pedir as contas e partir para essa empreitada.

Claro que nós não recriamos a roda, ao contrário, buscamos tudo o que já existia disponível: e-commerce open source, ERP na nuvem, sistema de warehouse management para ter no depósito, meios de pagamento, sistemas de automação de marketing, etc. Mas a gente sabia que era preciso ter uma cola para tudo isso funcionar, porque eram aplicações muito distintas, por mais que estivessem na nuvem e com código livre.  E foi aí que começou o embrião da nossa plataforma de integração.

Em apenas seis meses a empresa estava funcionando, sendo que três meses foram usados para o desenvolvimento da plataforma, que, claro, não era a mesma que usamos hoje, automatizada, mas que nos permitiu fazer uma integração entre as áreas que diminuía muito o custo de operação. Nós apelidamos o projeto de mini-Amazon e fomos ao mercado vender essa ideia de um e-commerce conectado. Logo tomamos o primeiro golpe, afinal, essa não era a nossa praia. E foi a partir daí que decidimos focar naquilo que realmente sabíamos fazer: lidar com grandes empresas. Focamos nosso negócio na plataforma de integração e começamos a crescer de verdade.

Guerra: Isso mudou a forma como você pensa em inovação? 

Bernardinelli: Mudou, claro. E por mais que a palavra esteja na moda, uma coisa é seguir um script pré-formatado e outra é criar algo do zero e viver o que estamos vivendo com nossos clientes. Cada solução que ajudamos a conectar é um caso de inovação. E, para isso, só precisamos que eles nos forneçam três coisas: conectividade, acesso e nos digam quem é o remetente e quem é o destinatário. Com isso, o cliente passa a pensar mais no dado em si do que nos problemas tecnológicos. E o problema existe em qualquer lugar do mundo, é igual. A nossa inovação é que passamos a vender uma espécie de tubo de fluxo de dados na rede, com plataforma, infraestrutura e serviços inclusos. Nosso negócio leva eficiência para o cliente, diferentemente do modelo de negócio tradicional no qual empresas de software e inovação trabalham na ineficiência do cliente, vendendo homem/hora.

Guerra: Por fim, queria sua resposta sincera, já que vivenciou esses dois momentos: o que tem sido mais fácil, empreender no Brasil ou nos Estados Unidos?

Bernardinelli: Nos Estados Unidos é um choque porque nós não temos tradição. Mas uma coisa que me ajudou foi que nos últimos 20 anos eu trabalhei com empresas norte-americanas. Por isso, aprendi que precisava trazer norte-americanos nativos para poder falar de igual para igual e vender nesse mercado. Da mesma forma que no Brasil eu precisei contratar o que eu não sabia fazer. Inovar tornou mais fácil admitir que preciso de ajuda. Eu saí do mundo corporativo no qual a gente esconde as coisas, não pode errar. E cheguei aqui, onde os erros são aceitos e nos fazem crescer.

 *Rodrigo Guerra é especialista em finanças e inovação. Atualmente vivencia um profundo mergulho na jornada do autoconhecimento – que deve trazer novidades em breve

Leia também:

Carla Tieppo: “Para inovar é fundamental trabalhar as próprias emoções”

Compartilhe

  • Facebook
  • Twitter
  • Linkedin

Assine a Unbox News